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quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A igreja do demo e a experiência estética em Vixe Maria! Deus e o Diabo na Bahia

Anna Carolina Lima

O espetáculo Vixe Maria! Deus e o Diabo na Bahia traz para os palcos a cômica história do Diabo que decide fundar, assim como Deus, sua igreja em solos baianos. A primeira cena começa com um diálogo entre o Diabo e sua noiva Naja. O assunto é a criação da igreja. O Diabo comenta com ela seu desejo de ter uma igreja só sua, que arrastasse multidões de seguidores.
A época em que se passa a história da peça nada mais é do que o Carnaval, momento em que o Diabo corre às soltas, como também nas festas de largo. Então, é a combinação perfeita para se aproveitar do clima de orgias e do “tudo pode” para que a intenção do Diabo fosse concretizada. Afinal, as pessoas ficam fora de si. Nessas horas elas dizem sim a tudo o que vem pela frente, tornando verdadeira a expressão “sujeito – sujeitado”, e são levadas pelas mais diversas más influências.
De uma forma descontraída os autores da peça, Gil Vicente Tavares, Cacilda Póvoas e Cláudio Simões contam todo o processo vivido pelo Diabo para tentar construir sua igreja, coisa que na verdade ele não consegue. Para conferir o desenrolar das tentativas do Diabo, Deus resolve descer com o anjo Gabriel, que aliás é quem muitas vezes segurou as pontas nas suas situações de descobertas da vida humana, como por exemplo no experimento da bebida “capeta”, depois da qual passou por uma certa ressaca. Além disso, Deus passa por muitas experiências estéticas aqui na terra, como a visita a um terreiro de Candomblé, uma puxada na maconha, a própria ingestão do capeta, as festas de largo e o Carnaval. Cada uma dessas experiências tem sua característica própria. As respectivas obras de arte em questão (religião, droga, bebida e festas), que atuam sob o que se chama de definitude para uns por ter interpretações limitadas, foi sentido por Deus como abertura porque ele as interpretou de um jeito contemporâneo de ser, quebrando as formas do gosto comum.
Comprovando o que pensa Boudieur: “as obras de arte e outros signos de consagração podem ser objetos de percepção diferentes”. Deus não tinha conhecimento prévio do que se tratava essas “obras” e compreendeu-as de um jeito inocente. Ele não tinha o domínio do significado para interpretá-las, como deve se proceder ao analisar uma obra de arte seja ela qual for, mas o que chamou minha atenção foi essa forma de percepção dele. Como um ser supremo pode achar esses tipos de experiências natural e gostar? Me parece estranho esse tipo de atitude, mas como se trata de um espetáculo contemporâneo e que foge ao que seria o normal de um Deus, posso levar isso em consideração, até mesmo pela forma humorística com que foi abordado. Ao atingir o grau máximo de contemplação da obra, Deus aprovou a mensagem que o artista quis passar, mesmo que em algumas dessas situações, se vividas por pessoas normais, não seria tão proveitoso assim. Isso mostra que houve o que Humberto Eco chama, que é a fruição, o que percebemos na compreensão dessa mensagem.
Se formos levar em consideração os paradigmas celestiais, tanto o Diabo quanto Deus não se dão bem. Tomando os dois como obra de arte percebemos que a experiência estética que um tem com o outro não é nada agradável. Um é do bem e o outro é do mal. Essa foi a atribuição de significado que foi dada desde os tempos primórdios e permanece até hoje. Tanto que se tivermos uma experiência dessa tiraremos as mesmas conclusões que se tinham no passado. Tudo é uma questão sócio – cultural. Isso condiciona a experiência estética.


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